O que era para ser um domingo de celebração da pacificação acabou virando sinônimo de violência. Vinte minutos antes de ser dada a largada para a terceira edição do Desafio da Paz, corrida de 5km realizada no Campo da Ordem, Vila Cruzeiro, Zona Norte do Rio, traficantes atiraram e causaram medo entre os participantes da prova. O evento, marcado para as 8h, só foi acontecer às 9h, por causa de estratégias de segurança da polícia e do Bope (Batalhão de Operações Especiais). Parte dos dois mil corredores inscritos não quis arriscar e resolveu ir embora assim que os tiros cessaram, 10 minutos depois. Entre 30 e 40 homens correram para oferecer segurança durante o percurso, que passa pela rota de fuga usada por traficantes em 2010, durante a ocupação da polícia no Complexo do Alemão, segundo o coronel Renê Simões, comandante geral do Bope
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Após tiroteio e com uma hora de atraso, corredores largam na terceira edição da prova (Foto: Bebel Clark)
Corredor há 20 anos, o secretário estadual de Segurança Pública do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, estava inscrito na prova e participou da corrida.

Beltrame correu a prova (Foto: Bebel Clark)
– Infelizmente foi uma ação criminosa, totalmente irresponsável, oriunda ainda de um resquício da facção do Comando Vermelho, que reinou absoluta na comunidade durante décadas. Mesmo enfraquecida, a facção ainda tem pessoas que acham que vão afastar a polícia daqui. No entanto, daqui não sairemos. Nós compramos o desafio nessa comunidade e, aconteça o que acontecer, seguiremos em frente. Eu já estava inscrito na prova, e se fosse corredor, gostaria de ver o secretário de Segurança aqui. Infelizmente, esse tipo de coisa ainda acontece. A paz é uma construção – afirmou o secretário que, aos 56 anos, fechou a prova com tempo de 35m36s, e colocou seus seguranças para correrem também.
Responsável pela prova, o coordenador do AfroReggae, José Junior, apoiou Beltrame e destacou a importância da realização da corrida, apesar do incidente.
– Existe toda uma questão simbólica (a luta pela paz) por trás dessa corrida, que já acontece há três anos. O evento reúne a sociedade como um todo – moradores da comunidade, atletas profissionais, policiais, políticos – e, mesmo com a tensão inesperada, o que importa é que a prova foi disputada. Seria triste cancelar a corrida.
Apesar do iminente perigo, embora sem feridos, o clima ao fim da prova era de descontração e felicidade entre os corredores que completaram o Desafio da Paz.
O VETERANO

exemplo de vitalidade (Foto: Bebel Clark)
O corredor mais idoso da prova era Gilson Martins dos Santos, de 72 anos, morador de Caxias. O aposentado corre há 25 anos e afirma que a corrida proporcionou a ele uma saúde de ferro.
– Não tomo remédio para nada. Tenho muita vitalidade, faço academia três vezes na semana, alongamento e ginástica localizada. Não bebo, não fumo, durmo oito horas por dia, e não saio à noite. Mesmo hoje tenho muita disposição e condicionamento perfeito, não apresento problema nenhum de saúde. Apesar do tiroteio, valeu a pena participar – afirmou Gilson, que disputou a prova pela primeira vez.
O NOVATO

Dias Alves é jogar futebol (Foto: Bebel Clark)
Contrapondo toda a experiência do veterano, o estudante Felipe Dias Alves, de 11 anos,integrante do Rota 5k do Futuro e morador do Leme, era pura alegria com a medalha estampada no peito após correr os 5km da prova em 27 minutos. O sonho dele? Ser jogador de futebol.
– Eu corro desde os nove anos e adoro, mas meu sonho mesmo é virar um fenômeno do futebol. Sou atacante, e a corrida me ajuda a correr no campo. Faço escolinha em três lugares diferentes.
Aos sedentários de plantão, o garoto dá um recado.
– Levanta da cama e vem correr!
O MORADOR E EDUCADOR SOCIAL
Impossível não se contagiar com a alegria do tio soldado Gabriel, personagem vivido pelo educador social Gabriel Costa, ex-militar do exército. Aos 50 anos, Gabriel se fantasia de urso de pelúcia em corridas e recreações infantis diversas. Para aguentar o calor de correr com a roupa, ele treina duas vezes por semana na esteira. E faz isso por amor.

de pelúcia: ele corre há 33 anos (Foto: Bebel Clark)
– Minha função é ajudar a ensinar as crianças a serem educadas com os pais, e diverti-las, porque existe uma carência muito grande de recreação nas comunidades. Aqui onde moro, na Vila Cruzeiro, existe uma creche que foi construída há um ano e continua fechada.
Corredor há 33 anos, Gabriel tem na corrida um lugar de encontro e felicidade.
– O que eu mais gosto na corrida é o calor humano, a alegria, aqui não existe diferença de classes sociais, é um ajudando o outro. Essa união deveria acontecer sempre, em todas as esferas. É muito gratificante. Quanto ao tiroteio, foi muito lamentável, deveria haver mais respeito, inclusive com o povo da nossa comunidade – disse o corredor, que participou de todas as edições do Desafio da Paz à caráter, e sonha em ganhar um carrinho de pipoca e um pula-pula para ajudá-lo em suas recreações infantis.
O MORADOR QUE BEBIA DEMAIS
Luciano da Silva Severino tem 33 anos e é torneiro mecânico. Há um ano, ele bebia praticamente todos os dias e não praticava esporte algum. Hoje, Luciano faz parte da 1ª equipe de corrida do Complexo do Alemão, e viu sua vida mudar.

a treinar com equipe de corrida (Foto: Bebel Clark)
– Ano passado eu estava num forró bebendo e vi a equipe de corrida passar. Achei aquilo interessante e resolvi fazer parte. Agora corro, em média, quatro vezes por semana, 7km por dia, e meu condicionamento mudou totalmente. Além disso, quase não bebo mais. Se eu soubesse que era tão bom praticar esse tipo de exercício, teria feito bem antes – disse Luciano, casado e pai de três filhos.
Quanto à prova, Luciano teve dificuldades nas subidas íngremes, que estavam escorregadias, e diz que vai se preparar melhor para vencer a próxima edição.
– Vou treinar com força total para chegar em primeiro no ano que vem, quero muito subir nesse pódio! De qualquer forma, estou feliz da vida. A sensação de saber que você conseguiu vencer seu próprio limite é gratificante demais. Esporte faz um bem danado à saúde.
E você? Já levantou do sofá hoje para praticar alguma atividade física?
Classificação Desafio da Paz 2013 – Complexo do Alemão:
Geral feminino
1ª – Failuna Abdi Matanga 20m12s
2ª – Caroline Jepkemei Kimosop 20m23s
3ª – Marcela Cristina Gomez 20m50s
Geral masculino
1º – Gilberto Silvestre Lopes 17m12s
2º – Mathew Kiptoo Cheboi 17m28s
3º – José Rodrigues da Fonseca 17m30s
Comunidade feminino
1ª – Luciana Ivonete da Silva 30m45s
2ª – Stephanie Savell 31m02s
3ª – Jéssica Sabino dos Santos 31m50s
Comunidade masculino
1º – Ronald da Silva Carlos 19m32s
2º – Severino Antonio da Silva 19m45s
3º = Evandro Domingos Corrês 20m42s
(Bebel Clark, Portal Globo Esporte)
Quero saber o resultado geral masculino da prova desde já agradeço. E que Deus abençoe a comunidade do complexo do alemão bora corre não podemos se timidar com o acontecimento deparado nesta comunidade maravilhosa abraços ano que vem estou nela novamente