O ex-coroinha Fabiano da Silva declarou à Justiça nesta sexta-feira, durante audiência dos padres acusados de pedofilia, que foi abusado sexualmente, desde os 12 anos, pelo padre Luiz Marques Barbosa. Fabiano, que aparece em vídeo mantendo relações sexuais com o acusado, relatou que sofria abusos constantes quando era coroinha da paróquia, onde os padres atuavam.

“Mantive para o juiz a história de que fui abusado desde os meus 12 anos. Tenho certeza que há outros coroinhas violentados aqui [em Arapiraca], mas eles não denunciam”, explica Fabiano dizendo que sua cidade, a 128 quilômetros de Maceió, é muito preconceituosa e não entenderia tal situação.
Além de Barbosa, os padres Raimundo Gomes e Edílson Duarte também são acusados de abuso e exploração sexual de menores. Aproveitando-se da condição de padres, além de Fabiano, eles teriam abusado de Cícero Flávio Vieira Barbosa e Anderson Farias da Silva durante vários anos, enquanto os rapazes eram coroinhas em suas paróquias. O julgamento é realizado na cidade de Arapiraca, desde as 9h. No momento, a primeira testemunha de acusação presta depoimento.
Sonho de ser padre
O segundo depoimento nesta sexta foi de Anderson Farias da Silva, hoje com 21 anos. Ao deixar a audiência, Anderson afirmou que era abusado desde 14 anos. “Esperei muito por este dia, estou aliviado e satisfeito”, disse. “Outros meninos sofrem abusos [aqui na cidade], espero que essas vítimas não tenham medo, criem coragem e denunciem.”
Na época dos abusos, Anderson era chefe dos coroinhas na paróquia e, como era muito envolvido com os trabalhos da igreja, tinha um sonho: ser padre. Quando perguntado se mantinha o desejo de seguir com a vida cristã, ele foi seco e conclusivo. “Não isso morreu, ele [padre Raimundo] tirou isso de mim.”
Antes de entrar para a audiência, a mãe de Anderson, Ana Lúcia Paulino da Silva, convesou com o iG sobre o filho. “Ele não tem vida. Meu filho não estuda, não trabalha e ele não sai de casa”, conta. “Meu desejo é que a justiça seja feita aqui e na igreja também”. O ex-coroinha Cícero Flávio também já prestou depoimento. Além de processo judicial, os padres enfrentam processo eclesiástico.
Vaticano acompanha caso
Por volta das 12h30, os representantes do Vaticano, Daniel Almeida e Menetti Severiano, chegaram ao local do julgamento para acompanhar a audiência. Ambos são padres alagoanos e, através de decreto episcopal, foram nomeados pelo Vaticano para auxiliar nas investigações. Segundo Almeida, o processo canônico começou no dia 14 de março de 2010.
“A Santa Fé [Vaticano] tem duas diretrizes em casos como este. A igreja sempre se posiciona a favor das vítimas. Mas também ela está preocupada e quer colocaborar com a justiça comum, a dos homens”. Quando perguntando sobre o vídeo, onde rapaz aparece mantendo relações com o padre, Almeida enfatiza que o dado é apenas prova de ato sexual entre dois homens. “O vídeo não constitui prova de crime de pedofilia”, diz ressaltando que no momento da gravação Fabiano tinha 19 anos.
Julgamento
Devido à limitação do espaço físico, só tem acesso à audiência pessoas ligadas ao processo, o que inclui dois representantes do Vaticano que vieram acompanhar o caso. O juiz que preside o caso, João de Azevedo Lessa, já informou que o julgamento deve se estender noite adentro e talvez seja remarcado, caso seja necessária alguma diligência.
“São muitas pessoas a serem ouvidas. Começamos com as vítimas, depois as quinze testemunhas de acusação e defesa, os réus e os advogados, que por sua vez ainda podem pedir para fazer as alegações por escrito. Aí, são mais cinco dias para que eles entreguem os memoriais e outros dez para que eu profira a sentença”, explicou Lessa antes da audiência. Apenas o padre Edílson tem oito testemunhas para sua defesa.
O promotor Alberto Tenório afasta qualquer tipo de pressão sobre o caso, que possui quatro volumes e quase mil páginas. “Este é o único caso no mundo com provas concretas do abuso, no caso o vídeo do monsenhor Luiz e a confissão do padre Edílson”.
Já o advogado de defesa de Luiz Marques e Raimundo Gomes não pensa da mesma maneira. Segundo Edson Maia, a única coisa que o vídeo mostra é seu cliente em uma relação homossexual consentida com um rapaz maior de idade. “E contra monsenhor Raimundo não há nenhuma prova concreta, é a palavra desses rapazes contra a dele, que nega os abusos veementemente”.
Segundo o promotor, a pena para abuso e exploração sexual é de 4 a 10 anos, podendo ser aumentada de um terço ao triplo, dependendo do número de vítimas e a reiteração dos delitos. Ele ainda faz um alerta. “É preciso deixar bem claro que o que está sendo julgado aqui não é a Igreja Católica, mas sim o desvio de conduta destes homens”.
(Ultimo Segundo)